
“Maria Quitéria”, por Domenico Failutti.
“ Mas uma voz secreta me sopra que também luto por mim. Estou guerreando, sim, para libertar Maria Quitéria de Jesus Medeiros da tirania paterna, dos sofridos afazeres domésticos, da vida insossa. Ah, eu combato, com água no nível dos peitos, pela libertação da Mulher, pela nova Mulher que haverá de surgir. Minha baioneta rasga o ventre de um português que não quer reconhecer a Independência do Brasil gritada, lá no Sul, pelo Imperador D. Pedro.”
– Hélio Pólvora, escritor brasileiro, sobre Maria Quitéria.
Nem só do grito do príncipe D. Pedro I foi feita a Independência do Brasil. Do Rio Grande do Sul às Minas Gerais o processo foi pacífico; da Bahia ao Amazonas, porém, a independência foi conquistada pelo povo e pela espada. A luta na Bahia durou cerca de um ano, e uma das grandes heroínas dessa guerra foi a baiana Maria Quitéria de Jesus.
Nascida em 1792 no Recôncavo Baiano, no distrito de São José de Itapororocas (atual Feira de Santana), Maria Quitéria cresceu em uma época em que às mulheres cabia a vida domestica e a obediência ao patriarca. Espírito amante da liberdade, Quitéria gostava mesmo é de andar de pés nus e cabelos ao vento. A mulher de traços indígenas amava a liberdade e seu espírito desejava independência: a de seu país e a sua própria independência enquanto mulher.
Em 1822, após a Proclamação da Independência, emissários do governo percorrem o sertão da Bahia, e chegam à vila de Cachoeira, à procura de voluntários para a guerra pela independência do Brasil. Vendo crescer na Bahia a opressão do exército português em relação à separação do Brasil de Portugal, Maria Quitéria, com a ajuda da irmã e do cunhado, foge de casa e vestida de homem alista-se como soldado Medeiros no “Batalhão dos Voluntários do Príncipe D. Pedro”, os Periquitos, organizado pelo major José Antônio da Silva Castro, avô do poeta Castro Alves.
Desde o início, Quitéria demonstrou grande habilidade no manejo das armas e disciplina militar, indo para o regimento da artilharia e em seguida para a infantaria. Quando descoberta sua identidade, Quitéria já havia provado grande heroísmo em diversas batalhas, sendo respeitada pelos milicianos. Livre em seu direito de ser mulher, agora cadete, desenha o próprio uniforme militar, que assemelhava-se ao dos soldados dos batalhões do Imperador acrescido de uma espécie de saia, e incluía um capacete com um vistoso penacho.
Durante a decisiva Batalha de Pirajá, Maria Quitéria atacou uma trincheira inimiga, fazendo 2 prisioneiros, e recolhendo-os ela mesma ao acampamento brasileiro.
Uma outra grande prova da competência militar e bravura de Quitéria ocorreu em 1823, durante a defesa da Foz do Rio Paraguaçu. Ali, consumida de amor pela pátria, capitaneou um grupo de outras mulheres heroicas, que lutaram com água até os seios, e juntas, evitaram o desembarque de soldados portugueses comandados pelo brigadeiro Madeira de Melo.

Monumento em homenagem à Maria Quitéria em Salvador.
Em 2 julho de 1823, os acuados portugueses, cercados pelo povo baiano por terra e mar, deixaram a cidade de Salvador durante a madrugada. Pela manhã, o “Exército Pacificador” brasileiro entra vitorioso na cidade, e Quitéria foi aclamada ao lado do General Lima e Silva, então comandante de todo o exército.
Terminada a campanha, Quitéria segue para o Rio de Janeiro, onde haveria de receber do próprio Imperador a insígnia de “Cavaleiro da Imperial Ordem do Cruzeiro”, além de um soldo pela bravura e pelos serviços militares prestados à causa da Independência do Império, na restauração da Bahia.
Durante sua passagem pela corte, Maria Quitéria impressionou a escritora inglesa Maria Graham, que escreveu: “Maria de Jesus é iletrada, mas viva. Tem inteligência clara e percepção aguda. Penso que, se a educassem, ela se tornaria uma personalidade notável. Nada se observa de masculino nos seus modos, antes os possui gentis e amáveis”.
Tendo um espírito amante da liberdade e sendo mulher num ambiente dominado por homens, a história de Maria Quitéria assemelha-se a de Joana D’Arc, a pastora de Domrémy. Um imenso sentido de patriotismo movia essas duas mulheres guerreiras que ajudaram a escrever capítulos importantes da história de seus países.
Maria Quitéria morreu quase cega ao lado da filha, esquecida na cidade de Salvador. O governador da época somente importou-se em notificar o cancelamento do soldo recebido por ela.
Desde 1996, Maria Quitéria tem sua foto estampada em todos os quartéis do Brasil e é a Patrona do Quadro Complementar de Oficiais do Exército Brasileiro, mas isso não é suficiente para honrar essa mulher em toda sua glória e bravura.
Maria Quitéria, alma guerreira. Emancipando o Brasil, iniciou a emancipação da mulher brasileira.
Que Maria Quitéria possa viver no coração das mulheres brasileiras, belas e bravas “caboclas negras” do amor!
♥ Amor+Luz ♥ Jo
Quer saber mais? Recomendo:
DE SOUZA, Bernardino José. Heroínas Bahianas – A participação da mulher nas lutas da independência.
http://www.imaq.org.br/maria_quiteria.php
http://www.bv2dejulho.ba.gov.br/portal/index.php/personagens/quiteria.html